# 1570



"Será a última vez?
Vou-te ter como se fosse...
Chegarei a ti, onde me esperas sempre, decidida a contemplar aquele lugar com a sua melhor recordação. Também ele guarda lembranças, constrói a sua história com o que rouba de nós. Assimila cada uma das sensações que fremem intensamente no ar. 
Aguarda-me, mas será outra a chegar por mim. Concebida em sangue que corre na ausência, alimentada pela fome de te ter. Serei o que nunca fui e tu nunca pensaste existir. Enclausurada em tempo que se perdeu. Um tempo que aproxima desejos, quebra pudores e exacerba o apego.
O reencontro de existências que se dissolvem numa só. O meu corpo a tomar conta do teu. Suores absorvidos pela pele na ressaca de um vício impossível de curar. A levitação do mais insano dos prazeres. Assomamos à esfera da utopia, onde só juntos poderemos chegar.
Abandono-te aí... Regressando pelo trilho construído em crenças estilhaçadas. Convicções continuamente reerguidas que não te cansaste de arruinar. Regresso na ousadia de provares o melhor dos dois. A excitação que desconhecias ser possível de sentir...
Liberto os sentidos impregnando de memórias os teus. Preso no que recusavas dar, arrastarás a loucura na busca do que só eu poderei saciar. Pedaços de nada, matéria sem cor, vestígios ocos do sonho redigido em nós.
Irónico amor que na última vez mais se faz ressurgir..."

Texto: Catarina Vale
Foto: Tânia João

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