# 1461



"Caminha. Percorre as ruas esquecidas duvidando se são reais. Portas que acenam, simpatia de escárnio, ludibriando a certeza de alguma vez ter transposto uma delas.
Abranda. Perscruta sinais que guiem os passos que não sabe se dá. Janelas, de luz escondida, contemplam o corpo vazio cobiçando os traços perfeitos e relembram as vezes que o viram passar.
Pará. Ignora as vozes, elimina o ruído, balançando nos sons que remanescem no ar. Risos, murmúrios, suspiros, palavras dispersas compõem melodias inaudíveis aos olhares indiscretos que invejam a insanidade de quem dança, ousadamente, ao som do que está a sentir.
Chora. O rosto escondido afagado nas mãos que se penitenciam pelos instantes do toque que as fizeram sonhar. Quando as mãos sonham o coração acredita, e delega no sangue que espalhe na pele o fervor de um ímpeto que o faz renascer.
Saboreia. O sal de uma lágrima que encontra o sorriso da boca silente que recusa gritar. O corpo aprisiona o que mais se faz ouvir, criando uma névoa que se aloja na mente fundindo-se na lucidez.
E ri. O cabelo solto encantando a luz que intensifica cores no desejo de a querer abraçar. É nos abraços de luz que a coragem comanda os membros que se submetem a ir no anseio de ficar.
Inspira. A busca do cheiro dos dias perdidos isentos da calma do tempo banal.
Avança. Carrega espectros, agora sombrios, que nunca deveria ter permitido ver… Recua. A incerteza da verdade que faz hesitar… Pesar por ir, pesar por estar…
O arrependimento é a pior forma de loucura?"

Texto: Catarina Vale
Foto: Maria João Alves

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