# 697




"Correu os dedos pelo cabelo. Foi um impulso aquele corte. Nos primeiros minutos pareceu-lhe o máximo. Agora reencostada na cadeira velha do jardim, observava os brinquedos desmantelados, por ali espalhados como carcaças sem cor, sem vida a habitarem uma relva crescida já murcha.
Podia ter tirado tudo aquilo dali. Mas teve medo. Podia perder o sentido da vida. Sempre contavam histórias aquelas carcaças. Ela lembrava-se de todas. Ainda.
Sorriu. Suspirou. Os olhos ficaram húmidos, passou as mãos pelo cabelo, cinco ou dez vezes. Não se sentia ela própria. Talvez isso fosse bom. Sentiu frio. Aborreceu-se, não pelo corte, nem pelos brinquedos, só pelo tempo. Tempo perdido."

Texto: Andreia Monteiro
Foto: Rui Mãos de Cenoura

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