# 4847



Catedrais

Não te oponhas se te disserem que és insignificante
Que nada tens de teu que seja digno de registo
Nem voz, nem talento, nem carne
Que não passas de uma enorme massa orgânica
Um breve eco quântico
Um comprimento de onda num rádio avariado
Escuta esses emissários emplumados
Panfletários
Suspensos como corvos falantes na esfera celeste
Numa grande catedral em ruínas
Dentro da Via Láctea
Arcos ogivais
Descarnados
Altares destruídos por aglomerados globulares
Repletos de pedras nuvens moleculares
E cálices de poeira interestelar derramada
Senta-te no meio dessa plateia de Galileus mendigos
Anãs vermelhas de roupas esburacadas
E nos sorrisos verdades desdentadas
Junta a tua voz à voz desses profetas malditos
Como um bando de aves exiladas
Flamingos coxos com as patas enterradas num pântano
Soletram récitas que encontram escritas nas esquinas da cidade
Nos passeios por onde passam
Na soleira das portas onde dormem
Abandonados.


Cathedrals

Don't object if you're told you're insignificant
That you have nothing of your own worth noting
No voice, no talent, no flesh
That you're just a huge organic mass
A brief quantum echo
A wavelength on a broken radio
Listen to those feathered emissaries
Pamphleteers
Suspended like talking crows in the celestial sphere
In a great ruined cathedral
Inside the Milky Way
Ogival arches
Discarnate
Altars destroyed by globular clusters
Filled with molecular cloud stones
And chalices of spilled interstellar dust
Sit in the middle of this audience of Galilean beggars
Red dwarfs in ragged clothes
And in their smiles toothless truths
Add your voice to the voice of those cursed prophets
Like a flock of exiled birds
Limp flamingos with their feet buried in a swamp
They spell out récits that they find written on the corners of the city
On the sidewalks they pass
On doorsteps where they sleep
Abandoned.

Texto | Text: Ana Paula Jardim
Fotografia | Photography: Luana Lessa

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